sábado, 30 de setembro de 2017

FIM DO MUNDO, UMA NOVA EDIÇÃO

Não sei se alguém percebeu, mas o mundo não acabou.
De novo.
Faz mais de 4,5 bilhões de anos que ele não acaba. Tempo demais, repararia alguém.
Desta vez, era para ter acabado no último sábado. Um espetáculo pirotécnico da Terra se chocando contra um planeta com a simpática alcunha de Nibiru. Finalmente, o Caldeirão do Huck ia ter um quadro interessante.
O evento “Fim do Mundo – Reserve seu camarote” já ganhou várias edições. Desde os anos de 90, quando Nancy Lieder, que conversa com amigos extraterrestres no Facebook, vislumbrou a Terra explodindo numa trombada interplanetária. O show de estreia foi marcado para 27 de maio de 2003. Ano do primeiro mandato do Lula. Moro está investigando se houve participação do ex-presidente no desvio do planeta.
Depois, o evento foi remarcado para 21 dezembro de 2012. No dia aprazado, nada do Nibiru. Apesar da ampla corrente de orações dos perus em vésperas de Natal. Mas a Columbia Pictures e o John Cusack fecharam o ano com superávit nos royalties de direitos para DVD e TV a cabo.
Neste ano, o folguedo estava agendado para o dia 23 de setembro. Muitos não viram porque era sábado e acordaram tarde. Outros não viram, porque não tinha nada, mesmo, pra ver: para desgosto dos foliões, o Nibiru não veio à festa, de novo. Nem mandou zapp se desculpando. De modo que nem chamaram a Anitta, pra substituir. Por isso, o mundo não acabou.
Veio outra segunda-feira. Com o mesmo Temer na presidência. E outro programa Encosto, da Lástima Bernardes.
Mas o mundo vai acabar, e a esperança ainda vai estar lá, firme, pendurada pelo mindinho, à beira do cântaro de Pandora. Pois, não é que o numerólogo David Meader marcou outra data para o espetáculo apocalíptico? 15 de outubro de 2017. Meade não vê motivos para a gente desistir do fim do mundo. É um sonhador otimista. Como Nostradamus, São João Evangelista e metade dos roteiristas de Hollywood.
Mas... quem nunca?
Sonhar com o fim do mundo é um modo de acreditá-lo sob o nosso controle. Síndrome de Pink e Cérebro. Assim a denominaria um psicanalista. Que gosta de ter as coisas sob controle. Mas, em vez de matá-las, prefere pô-las no CID.
Por isso, não faltam teorias criativas para o armagedom. Tensão pré-menstrual coletiva é uma delas. Por uma bizarra ação de influência fisiológica mútua entre as mulheres, todas entrariam em TPM na mesma semana. Seria algo entre The walking dead e Guerra do mundo Z. Sem os zumbis.
Duvido que precisemos chegar a tanto para a autodestruição. Hitler e Stalin não menstruavam. E, ao que se sabe, a natureza também não proveu Trump e Kim Jong-un de trompas de falópio.
Particularmente, acho que temos de ser pacientes e não esperar muito do mundo. Não esperar, por exemplo, que ele acabe. Por que o mundo é igual ao Brasil. Contra todas as expectativas e probabilidades lógicas, sempre resiste e sobrevive.
Todavia, isso não me impede de sonhar, como todo o mundo. Afinal, um pouco de utopia é fundamental para aguentar mais uma segunda-feira e outro programa da Lástima Bernardes.
Por outro lado, penso que há falhas de planejamento, na produção do apocalipse. Por exemplo: para que encomendar um planeta do outro lado do sistema solar pra destruir o mundo, com os Estados Unidos aqui do lado?
Falta logística.
Se queremos o fim do mundo, a gente tem que ser mais competente.
E pedir conselho para o pessoal do agronegócio.

sábado, 23 de setembro de 2017

OLHOS DE VIOLETAS ORVALHADAS NO OUTONO

Serão azuis, como os do pai? Negros, como os da mãe?
Os olhinhos, ainda cerrados, do bebê criavam expectativas. Fizeram um bolão. Estudaram genomas e linhagens. Às vezes, eles herdam dos avós, notou alguém, que tinha estudado genética nos programas do Fantástico.
A despeito, porém, de toda a ciência de Fantásticos e Globos Repórteres, ninguém previu aquilo: quando a criança ergueu as pálpebras, o que viram, foram uns estranhos e encantadores olhos de violetas orvalhadas no outono. Para a aflição dos pais e da cultura de massas, algum gene mutante queria fazer poesia com o bebê. Mas ninguém pensou em poesia.
– É coisa do seu sangue ruim!, gritou a mãe ao marido.
Deram importância. Podia ser um tipo de cegueira! Afinal, quem é que consegue ver como se deve, com olhos tão artistas?
Consultório de oftalmologia. A visão do menino é perfeita, desmentiu o médico. Não pode ser. Não acreditaram. Alguma coisa tinha de estar errada.
Veio o padre. O pastor. A benzedeira. O médium. A mãe-de-santo. Expulsaram demônios e encostos. Mediram aura. Consultaram almas. Nada. As violetas orvalhadas no outono fitavam, curiosinhas e indevassáveis, o fogo das velas, as cores dos búzios e miçangas, as gotinhas de água benta pintando arco de cores sobre as íris do berço. E sorriam, divertidas e desafiantes.
Afinal, elas tinham permanecido nove meses na escuridão. Adivinhando as cores do mundo somente pelas vibrações dos nervos da mãe, pelo sangue emocionado da mãe. O máximo de luz bebida na retina era aquela monotonia bege de vestido de madrinha de casamento. Queriam, agora, todas as cores, em todos os tons: verdes, azuis, amarelos; amarelo-siciliano, azul-serenity, verde-rúcula. O cardápio inteiro de um decorador de interiores, que os anjos sem sexo usaram para pintar a Criação. Que os outros vissem como os outros. Estes olhos de violetas orvalhadas no outono queriam os olhos de Monet. Que também nasceu com uma anomalia genética. Olhos com defeito. Não viam do jeito certo. Naqueles idos dos novecentos, nenhum cientista pôde prever a doença. E não puderam curar Monet. E Monet pintou quadros errados. Para nossa alegria e nosso prazer.
Quadros que só uns olhos de violetas orvalhadas no outono poderiam entender.
Infelizmente, já temos cura para eles.

RINGUE ELEITORAL

Um amigo confessou-me certo “cansaço eleitoreiro”. Disse que não aguenta mais escolher candidato como quem vai ao supermercado. – Parece...